VEDOVA, Emilio. "Ciclo 61N.8" |
O tachismo não pode ser considerado um
grande movimento, com suas características próprias e traços
distintivos. Nada mais é que uma espécie de tendência que deve suas
raízes à Europa, após a Segunda Guerra Mundial. O termo veio do francês tache, que significa mancha, sendo implantado pelo crítico Michel Tapié no livro Un Art Autre
(Uma Arte Outra). Tapié tentou, com essa ideia, designar um novo estilo
de pintura que dispensa toda a pompa da formalização, se desprendendo
de todas as correntes e estilos anteriores. O conceito "arte informal"
também pode definir o tachismo, mas apenas no sentido sem forma.
O
tachismo defende a improvisação que, associada ao gesto espontâneo e
instintivo, se permite mesclar elementos do expressionismo abstrato e
ter afinidades com o surrealismo. Valorizando o inconsciente, cria laços
com o dadaísmo, em função do apoio ao caráter irracionalista da arte e
no expressionismo, tomando a imaginação como expressão direta do
espírito do pintor. O uso de manchas irregulares e de cores remete ainda
às obras de Claude Monet.
O pintor e poeta
Jean-Michel Atlan, um dos expoentes da nova tendência pictórica,
definiu, em 1953, o caráter do projeto tachista:
"A pintura
para mim não pode ser derivada de uma ideia preconcebida; a parte que
cabe ao acaso (aventura) é muito importante e, de fato, é este acaso que
cumpre o papel decisivo no processo de criação".
Essa
arte informal deve ser analisada juntamente com seu quadro pós-guerra.
Além disso, a característica abstrata do tachismo acentua a descrença em
relação à racionalidade ocidental e à civilização tecnológica,
celebradas pelas vanguardas no começo do século XX. As grandes
filosofias da crise, em especial o existencialismo de Jean-Paul Sartre,
dão o tom daquela época no plano das ideias, reverberando nas artes de
modo geral. O novo exame crítico dos movimentos artísticos da primeira
metade do século XX dirige o foco dos novos artistas para o cubismo, que
também é uma influência ao tachismo como decomposição. Mas esta
decomposição, no caso do tachismo, deve ser explosiva, refletindo-se no
rompimento radical da forma até então imposta, longe da decomposição
analítica como querem Pablo Picasso e Georges Braque. A ênfase na
característica gestual do tachismo coloca-se como uma tentativa de
ultrapassagem tanto dos conteúdos realistas quanto dos formalismos
geométricos.
FAUTRIER, Jean. Grandes Etendues |
Em pintores como Hans Hartung e Pierre Jean
Louis Soulages, observa-se a recusa da fórmula racionalista pela
pintura apoiada no gesto. O conhecimento deriva da ação e esta se
apresenta pelo traço decidido do artista que abre e bloqueia espaços na
superfície da tela com o auxílio de linhas e borrões, negros e grossos,
que deixam entrever o fundo por pequenas frestas e intervalos. Em outros
pintores, a ênfase da pesquisa recai preferencialmente sobre a matéria,
como nos franceses Jean Fautrier e Jean Dubuffet, e nos trabalhos do
italiano Alberto Burri e do catalão Antoni Tàpies. Fautrier se
singulariza pelo desenvolvimento de uma técnica própria, que consiste em
pintar uma camada de tinta sobre a outra, com a qual ele obtém espessos
empastes. Sua série mais famosa, Reféns, 1943 nasce da experiência como
refugiado, quando assiste aos fuzilamentos dos prisioneiros de guerra
pelos alemães.
Em Dubuffet,
o trabalho com a matéria tachista conhece pelo menos dois resultados:
um que se liga às Texturologias produzidas em fins dos anos 1950, que se
caracterizam, como o próprio título indica, pelas texturas
experimentadas com cores e materiais distintos, e apontam na direção da
recusa da expressão ou da representação. Outro resultado advém da
associação da matéria ao desenho, que originam figurações cômicas como
L'interloqué, 1954 - no título, evidencia-se o jogo de palavras
designando aquele que está "impedido de dizer", o que, de outro modo,
retoma a idéia de incomunicabilidade característica da anarquia do
tachismo. Burri explora as potencialidades expressivas de maneira
diferente: solda, costura e cola seus sacos, madeiras, papéis queimados,
paus, latas e plásticos. Combustões, 1957 e Ferros, 1958 constituem
exemplos eloqüentes de seu projeto. A "pintura matérica" de Tàpies, por
sua vez, tem forte sentido trágico. Os muros intransponíveis, as janelas
e portas fechadas que negam qualquer acesso se relacionam diretamente
com a situação política espanhola.
BURRI, Alberto. Red Plastic |
Em artistas como Wols, os
caminhos da decomposição da forma são outros. O tom dominante nesses
trabalhos – menos que o gesto ou a matéria – é o traço, a linha e a cor,
que guardam relação com o lirismo de Paul Klee. A criação desse tipo de
signo também ocorre com o pintor e poeta Henri Michaux em O Silo, 1960,
assim como em Georges Mathieu, admirador da caligrafia oriental, Cast,
1964. Na Itália é possível lembrar os nomes de Emilio Vedova, Afro,
Renato Birolli e Giuseppe Capogrossi. No Japão, a arte informal tem
lugar em 1950 com o Gutai Bitjutsu Kyokai (Grupo Gutai) e o pintor Jiro
Yoshihara. No Brasil, as obras de Manabu Mabe, Tomie Ohtake e
Flavio-Shiró parecem se ligar ao tachismo ou ao abstracionismo lírico,
que conhecem adesões variadas entre nós, em Cicero Dias, Antonio
Bandeira e Iberê Camargo.
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