É evidente que há um princípio de conexão entre os diferentes
pensamentos ou ideias do espírito humano e que, ao se apresentarem à
memória, se organizam com certa regularidade. Isto é tão visível em
nossos pensamentos ou conversas mais sérias que qualquer pensamento
irregular que nos interrompe é imediatamente notado e rejeitado. Até
mesmo em nossos mais desordenados sonhos e devaneios notamos que a
imaginação não vagou a esmo, porque havia sempre uma conexão entre as
ideias. Se observarmos uma conversa solta e livre, notaríamos
imediatamente alguma coisa que a ligou em tosas as suas transições. E se
esse princípio faltasse, quem quebrou o fio da conversa poderia ainda
informar que havia esclarecido um seu espírito uma sucessão de
pensamentos, os quais tinham se desviado gradualmente do assunto da
conversa.
Até mesmo nos idiomas mais diferentes, naqueles que não conseguimos imaginar absoluta conexão entre seus termos, encontramos que as palavras que exprimem ideias mais complexas quase se correspondem entre si, o que é uma prova segura e simples de que há um princípio universal que tinha influência sobre todos os homens.
Embora seja perceptível para qualquer um a existência dessa conexão, creio que nenhum filósofo tentou enumerar ou classificar todos os princíprios de associação, assunto que parece digno de atenção. Para mim, há três princípios de conexão entre as ideias: de semelhança, de contiguidade e de causa ou efeito.
Um quadro conduz nosso pensamento naturalmente para o original (semelhança). Quando se menciona um apartamento de um edifício, naturalmente se introduz uma investigação ou uma conversa acerca de outros. (contiguidade) E se pensarmos em um ferimento, quase não podemos evitar a lembrança da dor do que o causou (causa e efeito). E à medida que examinarmos outros exemplos e o fizermos com o máximo cuidado, adquiriremos a certeza de que a enumeração é completa e inteira.
Como o homem é um ser racional e está continuamente à procura da felicidade, raramente age, pensa ou fala sem propósito ou intenção. Ainda que sejam inadequados os meios para alcançar seu fim, há sempre um objetivo em vista. Em todas as composições geniais é, portanto, necessário que o autor tenha algum plano ou objeto. Como esta regra não admite exceção, conclui-se que nas composições narrativas os eventos ou atos que o escritor relata devem estar unidos por algum elo, é preciso que estejam unidos na imaginação e formem uma espécie de unidade que possa situá-los em um único plano.
Um analista ou historiador que tentasse escrever a história da Europa seria influenciado pela conexão contígua no espaço e no tempo. Todos os eventos dentro de um período de um século, por exemplo, têm relação entre si mesmo que ínfima.
A relação mais habitual dentre os diferentes eventos que fazem parte de uma composição narrativa é a de causa e efeito; quando um historiador segue a série de ações em sua ordem natural, remonta às suas fontes e princípios secretos, descreve suas mais remotas consequências. Às vezes preenche as lacunas e que lhe falta conhecimento; e sempre tem consciência de que sua obra é mais perfeits em função da maior continuidade de cadeira de acontecimentos que apresenta ao leitor. Sabe-se que o conhecimento de causas não é apenas o mais satisfatório mas também instrutivo, pois é unicamente por este conhecimento que somos capazes de controlar e governar o futuro.
Resumo de:
HUME, David. Os pensadores. 1.ed. São Paulo: Editora Nova Cultura, 1999.
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